A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou sentença de reconhecimento de união estável em que as partes não tiveram a possibilidade de se manifestar sobre documentos juntados pelo Ministério Público em seu parecer. O MP atuou no processo como fiscal da lei, em razão da existência de parte interditada nos autos.
Para o colegiado, a sentença utilizou o conteúdo trazido pelo Ministério Público como um de seus fundamentos, de forma que autora e réu deveriam ser intimados previamente para que não fosse violado o artigo 10 do Código de Processo Civil, que veda a decisão surpresa no processo.
“Não se pode admitir que a sentença se valesse de fatos trazidos pelo MP não conhecidos pelas partes e não submetidos ao contraditório, causando prejuízo a elas, ante a notória surpresa”, afirmou o relator do recurso especial, ministro Moura Ribeiro.
Nos autos que deram origem ao recurso, uma mulher ajuizou ação de reconhecimento e dissolução de união estável, narrando que conviveu com o requerido, incapaz, entre 2002 e 2013 – período em que adquiriram patrimônio comum.
Partilha e pensão
Em primeiro grau, o juiz julgou parcialmente procedente o pedido de reconhecimento da união estável, determinando a partilha dos bens comuns e fixando pensão alimentícia em favor da autora.
O ex-companheiro apelou, alegando que o promotor atuou em prejuízo dos seus interesses ao juntar ao processo informações obtidas na internet, as quais serviram de fundamento para o juiz reconhecer a procedência do pedido da autora. Disse ainda que não teve a chance de se manifestar sobre tais informações, que diziam respeito à duração da união estável.
A sentença foi mantida pelo tribunal estadual, que rejeitou a alegação de nulidade, afirmando que o conteúdo juntado pelo MP apenas corroborou a prova já produzida nos autos. Para o tribunal, a atuação do MP como fiscal da lei não é necessariamente compatível com os interesses pessoais do interditado.
Representado por sua filha e curadora, o ex-companheiro recorreu ao STJ.
Atuação inusitada
O relator do recurso especial, ministro Moura Ribeiro, apontou que o juiz de primeiro grau, após afirmar que as provas não eram definitivas em relação ao período de convivência, concluiu que a união teve início em 2002, com base nas observações feitas no parecer do MP.
“A leitura dos fundamentos da sentença deixa claro que a convicção a respeito do termo inicial da vigência da união estável dos litigantes se formou com suporte no parecer do Ministério Público estadual, que trouxe para os autos, intrometidamente, documentos que obteve em pesquisa na rede mundial de computadores”, afirmou.
Segundo o ministro, os autos também indicam que não foi dada oportunidade ao ex-companheiro de se manifestar sobre os documentos obtidos pelo promotor de Justiça que atuou na ação. Moura Ribeiro destacou que os documentos foram juntados contra uma das partes e sem o consentimento dela, que foi surpreendida pela “inusitada atuação instrutória” do MP no caso.
“Como a sentença de parcial procedência foi mantida pelo acórdão recorrido, definindo até o termo inicial da união estável, o que repercute na esfera patrimonial dos litigantes, com amparo em fundamentação sobre a qual não se deu oportunidade de manifestação às partes, o julgado padece de nulidade e deve ser declarado ineficaz”, concluiu o ministro ao anular o acórdão do tribunal estadual e a sentença e determinar a reabertura da instrução probatória.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Fontes: jornaljurid.com.br e STJ